quinta-feira, 3 de junho de 2010

FENÔMENOS MEDIÚNICOS NA VIDA DOS SANTOS

Sylvio Ourique Fragoso



Parte V



Santa Thereza de Jesus

(Obra consultada: Recomposição da Vida da Seráfica Madre Santa Thereza de Jesus, de Antônio P. Carneiro Leão. Autorização de Alberto, Bispo Diocesano).

Esta foi, talvez, uma das maiores médiuns videntes que a história da Igreja registra em seus hagiológios.

Muitas vezes assediada por entidades obsessoras, foi tachada ironicamente pelos que não lhe entendiam a sensibilidade mediúnica, de "padroeira das histéricas".

Filha de numerosa família, desde cedo se impressionou com as cenas paradisíacas que os livros sacros prometiam aos seguidores da religião oficial. Ansiando por gozar as delícias do Céu, combinou com um de seus irmãos de irem à terra dos mouros, na esperança de serem decapitados.

Quando um pouco mais velha, perdeu parte de seus ardores religiosos, sendo levada por amizades levianas a cometer atos do que chamou de "vaidades mundanas". Conduzida que foi a um mosteiro, porém, readquiriu seu caráter místico.

Na vida austera que passou a levar, contraiu algumas moléstias. Eis como ela própria descreve suas dores:

"(...) parecendo-me algumas vezes que me mordiam o coração com agudos dentes, tanto que se temeu que fosse raiva. Com grande falta de virtude, sem nenhuma coisa poder comer, a não ser bebida, com grande fastio, com febre contínua e tão debilitada, porque me davam purgante todos os dias, durante quase um mês, estava tão escandecida que começaram a se me encolher os nervos com dores tão insuportáveis que nenhum sossego tinha de dia e de noite, e com mui profunda tristeza".

Esperamos que os leitores tenham para com os escritos da santa a mesma complacência que têm para com os nossos. Em verdade, alguém há de estar pensando em como faria Thereza de Jesus para comer a não ser bebida, ou como poderia ela sentir o encolher dos nervos, quando o que lhe encarangavam eram os músculos. Mas passemos adiante.

Thereza acabou por ficar em tal estado de debilidade que se viu forçada a andar de gatinhas. Espíritos obsessores a assediavam continuamente. Afeita às idéias religiosas a pobre mulher julgava-se perseguida pelo diabo. Assim descreve ela uma dessas aparições:

"Achava-me uma ocasião num oratório e apareceu-me ele (o demônio) do lado esquerdo, de abominável figura; e porque me falou, olhei-lhe especialmente a boca, que tinha espantosa. Parecia que lhe saía uma grande chama do corpo e que era toda clara, sem sombra; disse-lhe espantosamente que eu me havia livrado de suas mãos, mas que ele me tornaria a elas. Tive grande temor, benzi-me como pude, ele desapareceu e logo voltou; por duas vezes me aconteceu isto; não sabia o que fazer de mim. Tinha ali água benta; lancei-a para aquele lado e nunca mais ele voltou".

Não obstante a água benta e a declaração de Thereza de que "nunca mais ele voltou", prossegue a religiosa na mesma linha:

"Outra vez esteve me atormentando durante cinco horas (...)".

E mais adiante:

"Quis o Senhor que eu entendesse como era o demônio, porque vi junto de mim um negrinho muito abominável, arreganhando-se por onde pretendia me ganhar. Como o vi, ri-me e não tive medo porque havia ali algumas comigo que não se podiam valer, nem sabiam que remédio darem a tanto tormento, pois eram grandes os golpes que ele me fazia dar, sem poder opor-lhe resistência, com o corpo, cabeça e braços, e o pior era a agitação interior, pois de forma alguma podia ter sossego".

Note-se que a pobre enferma ao ver a entidade que a perseguia, riu-se e não teve medo "porque havia algumas (freiras) com ela". Na verdade, qualquer pessoa sente-se mais valente se contar com outras presenças humanas a seu lado no momento de enfrentar o pouco usual.

Vemos por essa descrição que Thereza já estava praticamente a braços com a obsessão, pois não só enxergava a entidade arreganhada, como também era forçada a dar golpes com os braços e a cabeça, sem poder opor-lhe resistência, possivelmente já incorporada. Mas pediu ainda às religiosas que lhe trouxessem água benta, em que depositava tanta fé. É aspergida com ela, mas nada valeu. Aí ela própria jogou a água sobre o Espírito, que a deixou. "Fiquei cansada como se me tivessem dado muitas pancadas", declara Thereza de Jesus.

Esta última declaração parece confirmar que a monja estivesse realmente obsedada. A sensação de ter levado muitas pancadas é característica daqueles que se libertam, ainda que temporariamente, de entidades espirituais de baixo teor vibratório. Já no Evangelho de Marcos (Mc 9, 14-27) vemos um homem, aproximando-se de Jesus, declarar:

- Mestre, eu te trouxe meu filho, que tem um Espírito mudo. Este, onde quer que o apanhe, lança-o por terra e ele espuma, range os dentes e fica endurecido.

- Trazei-mo cá, disse Jesus.

- Eles Lho trouxeram. Assim que o menino avistou Jesus, o Espírito o agitou fortemente. Caiu por terra e revolvia-se espumando. Jesus perguntou ao pai:

- Há quanto tempo lhe acontece isto ?

- Desde a infância, respondeu-Lhe, e tem-no lançado ao fogo e à água para o matar.

Vendo Jesus que o povo afluía, intimou o Espírito imundo e disse-lhe:

- Espírito mudo e surdo, eu te ordeno: sai deste menino e não tornes a entrar nele.

E gritando e maltratando-o extremamente, saiu. O menino ficou como morto, de modo que muitos diziam:

- Morreu...

O acontecido com Thereza de Jesus não é, pois, novidade. Já os discípulos do Divino Mestre o registraram e cenas semelhantes ainda acontecem nos trabalhos de desobsessão.

Mas a freira prossegue a narrar seus infortúnios:

"Outra vez estava eu no coro e deu-me um grande ímpeto de recolhimento; retirei-me dali a fim de que não o entendessem as outras que ali se achavam, apesar de que perto do lugar onde eu estava ouvirem todas darem grandes pancadas; e eu ouvi falarem perto de mim".

Não sabemos o que, exatamente, a religiosa chama de "grande ímpeto de recolhimento". Poderia ser um assédio de Espíritos malfeitores para afastá-la dos serviços religiosos, como também poderia ser a sensação, muito freqüente nos médiuns, de notar que um Espírito pretende dar uma comunicação, principiando o envolvimento fluídico. De qualquer sorte, Thereza revela-se aqui também como médium de efeitos físicos, pelas "grandes pancadas" que se faziam ouvir perto de onde estava. E vê-se que a monja era ainda médium auditiva. Pena é que Thereza não revelasse o que ouviu falarem perto de si, talvez por não ter entendido. De qualquer forma, é também freqüente aos médiuns auditivos esquecerem quase instantaneamente o que os Espíritos lhes ditam, ficando a mensagem como que arquivada na sub-consciência, para influir, depois, no comportamento, como intuição do momento.

Raramente um médium obsedado se vê perseguido por uma única entidade. Os malfeitores do espaço, como os da terra, muito freqüentemente se agrupam em bandos. É a atração do semelhante pelo semelhante. Diz Thereza:

"Outra vez via uma grande multidão deles ao redor de mim e parecia-me haver uma grande claridade que me cercava toda e que não consentia que se chegasse a mim".

Nota-se que Thereza de Jesus, a exemplo do que infelizmente acontece com tantos médiuns, vacilava em sua fé. No caso aqui exposto, ocorrido possivelmente num dos momentos em que ela se achava em melhores condições espirituais, seu próprio campo áurico a defendia do assédio das sombras.

Na verdade, houvesse sempre equilíbrio, elevação espiritual, bons pensamentos e estado de prece, e ninguém se veria subjugado por Espíritos inferiores, que não conseguiriam entrar em sintonia com uma aura de vibrações mais altas, o que os manteria afastados, a espreita de uma oportunidade para o ataque. Quando a ocasião surge, quando o assédio se concretiza, a culpa é do médium, que esqueceu o preceito de Jesus, o "orai e vigiai". Então acontece o que se deu com Thereza de Jesus que em outra oportunidade assim se expressa:

"Às vezes nas tentações de que já falei me parecia que eles tornavam a despertar em mim todas as vaidades e fraquezas dos tempos passados".

Mas não só de Espíritos malfeitores eram constituídas as visões de Thereza. Nessas ocasiões ela supunha estar no Céu:

"Estando uma noite tão doente que queria me escusar de ter oração, tomei um rosário para ocupar-me vocacionalmente. Estive assim um pouco e veio-me um arroubamento de espírito com tanto ímpeto que não me foi possível resistir-lhe. Parecia-me estar metida no Céu e as primeiras pessoas que ali vi foram meu pai e minha mãe".

novembro/1979

Nenhum comentário: