quinta-feira, 3 de junho de 2010

ANTOLOGIA DE TROVAS

ISMAEL GOMES BRAGA



Depois das maravilhas de “Parnaso de Além-Túmulo” e “Antologia dos Imortais”, os poetas voltaram à Terra para nos dar 312 trovas, isto é, quadrinhas de sete sílabas com um pensamento completo.

O novo livro foi preparado, para publicação, pelo mesmo erudito Elias Barbosa que organizou a “Antologia dos Imortais”. Para isso, consultou ele 73 obras sobre poesia e nos dá excelentes biografias dos 95 poetas que escreveram o livro pelas mãos de Francisco Cândido Xavier e Waldo Vieira. As trovas de números ímpares foram recebidas pelo primeiro e as de números pares pelo segundo desses médiuns.

E’ curioso que todos os poetas sejam de tempos recentes, quase todos nascidos no século dezenove. Só vimos um do último decênio do século dezoito, nascido em 1791 e desencarnado em 1857.

Outro fato digno de nota é que os melhores poetas, os verdadeiros poetas, morrem jovens, trazem missão breve. São muito raras as exceções e uma dessas exceções é já aludida acima, de poetisa nascida em 1791 e desencarnada em 1857. Trata-se de “A Cega”, como era conhecida a poetisa gaúcha Delfina Benigna da Cunha, mulher bela e enamorada, cuja vida mesma é um poema comovente e misterioso.

Naquele tempo não existiam livros para cegos, como hoje. Delfina ficou cega aos vinte meses de idade; portanto, teria a triste sina de ser analfabeta. Sem a reencarnação não se poderia compreender como aprendeu ela a língua e a versificação para deixar livros de versos impecáveis. Realmente nasceu sabendo, nasceu literata.

A aparição de “A Cega” nos meios espíritas ocorreu aqui no Rio, numa sessão a que assistiam o doutrinador cego Luís Antônio Mileco Filho e o autor destas linhas. Pela médium Dolores Bacellar, Delfina Benigna da Cunha nos contou em lindos versos a sua dolorosa história e nos deu pistas para encontrarmos notícias de sua vida, encerrada um século antes e já completamente esquecida.

Neste novo livro, que traz o título de “Trovadores do Além”, essa poetisa colabora com as trovas 238 e 310, que dizem:



Suor de todo momento —

Vida elevada de plano.

Dia atolado na rede —

Suicídio cotidiano.



Casamento — obra de Deus —

Obrigação para dois:

Encanto chega primeiro,

Serviço chega depois.



O mais perseverante desses doutrinadores em verso é Casimiro Cunha, que já nos apareceu em “Parnaso de Além-Túmulo”, “Cartilha da Natureza”, “Gotas de Luz”, “Juca Lambisca”, “Antologia dos Imortais”, e, agora, em “Trova­dores do Além”. Eis algumas trovas dele:



Se alguém te insulta, a ferir-te

O anseio de amor e paz,

Não lamentes, nem te irrites...

Calando-te, vencerás.



Fiscaliza as palavrinhas.

De humilde e pequena brasa,

Começa a lavrar o incêndio

Que devora toda a casa.



Levanta, ajuda e conserta,

Que falar e repreender

São tarefas da palavra

Que todos podem fazer.



Não olvides que a criança,

No caminho, vida a fora,

Vai devolver-te, mais tarde,

O que lhe deres agora.



A trova é como que um provérbio um pouco mais longo e rimado, com finalidade educativa; não pode ser apenas beleza, senão...



“À trova com boa rima

Mas sem um bom pensamento

Lembra uma linda menina

Com cabecinha de vento.”



Devemos escolher as que mais se aplicam ao nosso caso ou melhor se afinam com o nosso gosto, e decorá-las para aplicar na vida.



Emílio de Menezes colaborou com excelentes trovas neste livro. Eis uma amostra:



Estranha contradição

Que a Terra vira e revira:

Muita mentira é paixão,

Muita paixão é mentira.


Ninguém cometa a loucura

Que até hoje inda me abafa.

Coisa triste é a sepultura

Com lembrança da garrafa.



Esclarecer nunca pude

Esta nota incontroversa:

Muito silêncio — virtude,

Muita virtude — conversa.



O livro todo é de trovas escolhidas. Se fossemos citar tudo que nos agrada, teríamos de copiar o livro inteiro.



E’ uma obra para se reler sempre, como outras de bons versos, igualmente recebidas pelos médiuns de Uberaba.



Há mais de uma centena de bons poetas trabalhando para nos ensinar boa doutrina, no Brasil, presentemente. Não sabemos de caso semelhante em outras terras. Nossa responsabilidade está crescendo sempre!



Fonte: Reformador – abril, 1965

Responsável pela transcrição: Wadi Ibrahim

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